quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Dois perfis.


Algumas pessoas já nascem chorando. Outras, no entanto, precisam de um tapa para o primeiro sopro da vida. 

Existem dois tipos de pessoas. Há as que exalam felicidade e que não possuem medo de buscá-la. Acho que são aquelas que vêem na dor uma oportunidade de compartilhar algo profundo. São receptivas para o mundo. São livros abertos, pois no íntimo sabem que suas histórias compensam ser lidas, já que são boas histórias, afinal. Acho que são mais sensíveis também, visto que se percebem tudo o que sentem – já que não têm problemas quanto a falar sobre isso – são, conseqüentemente, habilidosos na arte de perceber o que os outros sentem, isto é, de olhar nos olhos e transmitir tudo o que está em suas mentes com tanta facilidade! Falam abertamente sobre suas experiências e idiossincrasias. Fragmentam-se, mas é evidente que possuem poder suficiente sobre cada parte, pois são capazes de recolher cada pedacinho de volta. Vejo essas pessoas por aí, em abraços íntimos, em sorrisos estouvados, nas lágrimas libertas perante outrem, esboçando uma vulnerabilidade intrépida. Admiro-as, pois essas pessoas não são: Eu.

Há outro grupo de pessoas, que são a antípoda das espontâneas. Essas possuem a felicidade latente, perturbando a sua aparente tranqüilidade. Impassibilidade. Honestamente, mesmo, eu sequer sei definir essas pessoas inúteis. Mas vou tentar. Admito, com antecedência, que pode parecer confuso. Provavelmente porque não as conheço suficientemente bem, e, mesmo assim, sinto essa vil necessidade de traçá-las por meio de palavras. Projetar um retrato falado, não para incriminá-las, mas para reconhecê-las. Preciso delinear esse enigma. Pintar um quadro funesto, mesmo que no escuro. Escrevo ignorante, na tentativa de encontrar uma verdade para aqueles que não falam com o coração. Que guardam para si a melhor parte do humano. Qual? Tudo o que sentem. Não sei se é deliberadamente, ou se é hereditário, que alguns indivíduos não legitimam os seus sentimentos, compartilhando-os. Provavelmente porque não se sentem dignos o bastante, ou porque seus pensamentos são ruins demais, imagino. Ou pior, porque não pensam em nada. Não os condeno. Pode parecer patético, mas eu sempre me surpreendo tentando não pensar em nada. Fitar a vastidão do vão. Ouvir o eco do oco da minha grande e estúpida cabeça. Surpreendo-me reprimindo meus pensamentos saudáveis e ostentando os estranhos. Decididamente, minha cabeça não funciona bem. É por isso que não me cansarei de aconselhar meu caríssimo – e mais que hipotético – leitor: Não leia a mim. Pois eu não sou saudável em letras. Eu não costumo me ler. Principalmente para os outros, para o mundo. Se eu fosse uma história, das duas uma: seria um drama fatigante ou uma comédia funesta. Sim, paradoxal. Este é o meu lema, o meu eterno humor negro. Entretanto, não posso me perder do meu fito por melindres. Estou falando sobre definir os que não choram, não falam e que vivem apáticos, em um eterno estado de letargia. Um trauma incurável do nascimento. Parece que elas ainda não se habituaram ao ar fora do útero. Ainda sentem as vias respiratórias inflamadas? Preferiam o mundo escuro, aquoso e seguro do ventre materno? A minha vontade é de dar um tapa nessas pessoas para ver se elas despertam, para vê-las chorar, gritar. O primeiro tapa da vida não foi o suficiente? É necessário chorar de novo. É estranho ver como algumas criaturas parecem andar para trás, transgredir... Como se dia a dia, simplesmente desaprendessem a viver!

Falando sobre aprender, - e já que eu comecei com “falando” -, lembrei-me de que custosamente aprendi a falar. Mas digo, falar normalmente, o bom, ou razoável, português de uma criança que inicia a língua materna. É engraçado lembrar – minha mãe conta – como eu parecia estar inserida em outro mundo. E eu disse “falar normalmente”, pois falar eu falava. No entanto, nada que um extraterrestre pudesse entender. E o mais estranho, falava a ninguém, que alguém pudesse ver. Quer dizer, eu havia escolhido como língua, uma indistinguível, e como interlocutor, um inexistente. Ironia isso, pensei agora, pois esse é o tipo de coisa que estou fazendo exatamente neste momento. Falando a ninguém e, certamente, com uma sintaxe tão grotesca, que torna impossível qualquer entendimento semântico para o meu tão saudado e hipotético leitor. Assim como fazia antes, com o meu “hipotético”, ou imaginário interlocutor. Na época alcunhavam-no de “amigo imaginário”. Talvez eu só estivesse treinando a minha habilidade de falar com um ser que por não existir, não se importaria. Daí quem sabe, um dia não estaria tão inepta para me comunicar com as pessoas de verdade. Taí, talvez seja esse o problema dos nossos inúteis retraídos – aqueles que possuem a felicidade indevassada, e não dissipada, como nos espontâneos. Enfim, talvez – talvez (!) - os que não conseguem falar com o coração, com as mãos, olhos e sorriso, às pessoas, ao mundo - estes mudos de expressões, porventura, só estejam esperando o ensejo para manifestar a sua aptidão para abrir suas mentes. Eles já aprenderam a falar, não obstante, sem sangue e coração. Perdoem o romantismo exagerado/açucarado. Espero, sinceramente, não deixar o leitor diabético.

En- fim (!) acredito que esses indivíduos estejam presos à sua condição hermética, recolhendo-se num ostracismo sutil de suas comoções e pensamentos desordenados. Um constante e pertinaz labor: Sufocar dia a dia o motim que persiste em se instalar, por detrás das argamassas que sustentam a aparente – e dissimulada – calma. É por isso tudo que os retraídos estão presos por suas próprias sentinelas emocionais. É por isso que não conseguem se libertar em abraços íntimos, lágrimas estouvadas, sorrisos e deliberações. Estão imobilizados por seu comedimento no medo de... Se magoarem? Duvido. Humm... Suspeito de que temem descobrir que compartilhar a dor não compensa. Nada muda. Demonstrações de afeto nem sempre indicam genuína afetividade... Mas a felicidade ainda está latente... Latejando... Perturbando a impassibilidade medíocre. Suspeito de que o maior temor das pessoas que não descortinam seus pensamentos para outrem é decodificar a si mesmo e se surpreender. Desconhecer-se. Isso, considerando que é nessa mútua descoberta, que nos conhecemos verdadeiramente. Logo, talvez, o medo esteja na verdade traçada pela descoberta. O medo que sustenta a latência da felicidade está na entrega. No temor de se tornar suscetível. E, sobretudo, na insegurança que os da felicidade latente têm das conseqüências de tais escolhas. Das implicações da oferta silenciosa – os fragmentos de si mesmo. Especialmente porque neles deve haver a consciência de sua impotência perante tais fragmentos. Poderão mesmo pegá-los – os fragmentos - de volta, uma vez estes distribuídos?

Parece, portanto, mais lógico, ou mais seguro, permanecer na mediocridade – letárgico e apático. E não os reprovarei. É certo que é deveras covarde. Mas que é isso tudo se não um evidente mecanismo de defesa? É irrefutável que, uma vez experimentada a felicidade, certamente virá o sabor acre. E será sempre assim, prazer e dor. Um quadro perfeito da dualidade intrínseca à condição humana.

Como eu disse, algumas pessoas nascem chorando... As outras, bom, se não for no primeiro instante de vida,  a vida, mais tarde, se encarrega de nos dar o primeiro choro, ou qualquer outra indicação de que estamos, de fato, vivos, não catatônicos, mas, inteiramente vivos.


Ouvindo: "Make me Over" - Lifehouse.

sábado, 3 de outubro de 2009

Diagnósticos diferenciais para pensamentos funestos.

Sintomas;

Pensamentos lúgubres passeavam sob sua pele. Assustava, sobretudo, a lucidez do seu desespero. Ah, a impetuosidade do sangue que corre intrépido no sistema involuntário, correndo constantemente, irrigando os órgãos pútridos. E o líquido aquoso que se punha para fora dos globos oculares! O conhecido sal quente e úmido percorrendo-lhe as maçãs da face tumefata. Procurando, pois, o caminho já conhecido, beliscando o septo nasal, arriscando-se nos lábios, adentrando a boca, e fazendo-se reconhecer, enfim, nas papilas. Sua face, intumescida, evidenciava o que o seu falar lacônico não proferia, na inútil tentativa de negligenciar as palavras ocultas pelos traços duros, sustentando obstinadamente impassibilidade e rigidez. A inconveniência da face intumescida estava no esboço da torrente funesta que era silenciosamente guardada sob a pele seca, pitoresca.

Possíveis causas;
Será a condição física quimérica?Fantasmagórica? Dantesca?

Se não, serão suas circunstâncias intelectuais impregnadas de vício, não saberes, inundas por pedantismo alheio ao conhecimento?

Psicológico, talvez? Às vezes, parece tão intrínseco, inexpugnavelmente biológico.

Será essa a condição mundana de viver?

Ou a relutância de viver no mundo?


P.s.; Tal essência de pensamentos funestos traça um deliberado final trágico?

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Caminho mudo no passo surdo.

Caminho mudo no passo surdo, ignorando as veredas onde este me porá
Se estou cego ou se estou no escuro, ah, já não sei, não sei por onde rumo
vou construindo versos na inútil tentativa de simplesmente delinear
o meu ponto de chegada, tecendo palavras e veemente pergunto -
mais uma peremptória década ou mais um senhor segundo?
Mapeio, pois, assim, a fim de desvelar a forma fugidia
No esforço infrutífero, que se não me tormenta
Ao menos me alivia, pois se desconheço o
Tempo, cabe a mim estabelecer a forma
Fazendo de um árduo labor o que
Outrora, fora forte agonia
Pois é o que você faz que
benevolente o torna
Passo então, no
Caminho que
Sinuoso e
sem

é
nu
e
tem
segredos e
então,arrefeço-me
e não mais ignorarei
que em tempo algum sofri
Por simplesmente não saber
De como será a minha partida
Tal é, a circunstância dessa vida
A ampulheta torta e imprevisível!!
Guarda escondida a bebida que escoa
Pela taça invertida, celebrando o tempo
que o Tempo me der, aproveitando cada
uma das gotas do vinho que lhe couber,bebo
A



v
i
d
a
.

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Canção Bucólica.



Neste lado da cidade
Eu posso ver o céu de cabeça pra baixo
O Sol está se escondendo
Mas eu posso sentir o calor na minha pele
De repente, eu sinto a brisa em minha face
A chuva começa a cair suavemente em meus pensamentos
As palavras estão penduradas em minha língua
As gotas de chuva escrevem a minha canção.
Os pássaros voam longe, fugindo livres entre as nuvens
O chão está molhado
O som da água caindo alcança meus ouvidos
Delicadamente, como uma canção de ninar
Tão docilmente, preenche meu vazio por dentro.
Eu posso sentir a mudança do tempo
Minha inspiração nunca se esvai
Eu posso sentir o Sol queimando sob minha pele
Eu sei que posso voar
Com apenas um olho aberto para a realidade
E um olho fechado para os meus sonhos.
Então, finjo que posso voar
Esqueço o chão, a névoa
E a tempestade
Lembrando que tudo é vão
Que tudo é menos que os matizes remanescentes da agonia dos céus.
Ouvindo -
James Morrison,feat Nelly Furtado - "Broken Strings"

terça-feira, 28 de julho de 2009

Expectativas.


Começarei este post de hoje abordando coisas que podem parecer absurdamente desconexas. Mas eu sempre tento chegar aonde quero. Bom, geralmente consigo, mas como já citei aqui, pode ser que não valha à pena, pois, dependerá do que o enunciatário deseja ouvir.

Primeiramente, gostaria de falar de uma canção. Secundariamente, quereria fazer alusão a uma filosofia pessoal, razoavelmente antiga.
No entanto, antes que eu me esqueça, preciso fazer uma advertência. Advirto-o desde já sobre a minha patológica capacidade de relacionar fatos e, logo, peço desculpas antecipadas se causar no leitor chatíssimas confusões de semântica e principalmente de coesão. Provavelmente, as confusões são minhas, não suas. Logo, decididamente, a leitura exige atenção, portanto não se distraia. Não obstante, pode ser que eu me distraia caro leitor, então o advirto mais uma vez que você pode se sentir perdido aqui, ou até mesmo contrariado. E digo mais: Não se surpreenda, já disse que escrevo quase que exclusivamente para mim mesma, buscando simples – ou complexas - exteriorizações. E se me refiro a alguém como “caro leitor” é só mais uma ferramenta para facilitar meus monólogos, retóricas, oratórias existenciais, blábláblá... Terceira e última advertência: Se tudo isso o aborrece, aconselho-o afavelmente, não perca seu tempo “lendo-me”. “Por quê?” Assunto supracitado. Não estou aqui para dizer coisas bonitinhas, tampouco para falar de paixões ardentes da meninice. Não, não estou manifestando desdém quanto a estes assuntos. Respeito-os. Isso, porém, definitivamente não faz meu estilo. Gosto de discorrer sobre verdades, questões existenciais e um pouco mais. Pelo menos no momento. E se nada disso lhe soa simpático, pegue um bom livro e divirta-se!

Bom, faz algum tempo, estava lendo um bom livro - A Cabana - nele, li certas coisas que me fizeram lembrar algo que escrevi. Não por sua relação direta, mas por simplesmente eu estar naquele momento fitando a resposta para alguns de meus questionamentos. Melhor, a confirmação.
Há uma canção minha, um trecho. A relação inicial. Este trecho despertou em mim a vontade de vir aqui e tecer palavras e pensamentos que ecoam em minha mente. Então seguro todos eles numa ponta de lápis e concretizo-os. Marco no papel amarelado com a mão que tenta – inutilmente – alcançar as torrentes de pensamentos, conexões, sinapses nervosas se interligando... Eis o trecho significativo, motivador;
“Estou esperando por um suspiro, uma palavra, uma carta. Olhando para o céu, eu estou me perguntando por que eu não consigo ver as razões da vida. Então eu procuro-a em cada canção que cada livro canta para mim, todas as noites antes de eu dormir.”
Este livro foi a resposta.Ou melhor, a confirmação. Talvez tudo faça mesmo algum sentido. Talvez haja certa conexão em todas as nossas atitudes e escolhas. O que queremos e o que buscamos. Talvez acabemos encontrando.
Eu tenho uma filosofia na qual eu me recuso a acreditar em expectativas. Expectativas são paradigmas, estáticos. Relacionamentos são ações, dinâmicas. Como poderia haver relação em coisas tão distintas? Expectativa é eufemismo para “exigências”, uma dissimulação para regras gerais que limitam. Nada deveria ser baseado em expectativas, pois tudo se restringiria a um verbo destrutivo: DEVER. E creio que relacionamentos estão muito além de tais denominações. Está no interesse desinteressado. Na reciprocidade livre de poder. E de suas subseqüentes hierarquias. O relacionamento é constituído da espontânea e mútua subordinação e subserviência para com outrem. No interesse primordial de ouvir sem esperar ser ouvido. E foi nesse livro – A Cabana – que li algo genial. Algo que agora tornou-se indubitável para mim. “Os humanos tentam controlar o comportamento do outro para chegar ao resultado desejado por meio das expectativas.” E mais: “Eu conheço e sei tudo sobre você. Porque teria uma expectativa diferente daquilo que já sei? Seria idiotice. E, além do mais, como não a tenho, vocês (humanos) nunca me desapontam.”
Basear relacionamentos em expectativas é a prova do quão pouco conhecemos o outro. E da quão ilimitada é a nossa prepotência. Em querer moldar. Em vez de simplesmente aceitar. Espero que possamos nos abster do poder. Para um dia chegarmos à quintessência do respeito, da consciência dos limites daqueles que estão próximos. Que desliguemos conceitos, substantivos, como responsabilidade e dever, do significado genuíno de se relacionar com o outro, seja qual for a forma. E que sejamos, enfim, livres de modelos e padrões para construirmos nossos relacionamentos e o façamos a partir de nossos sentimentos, com espontaneidade, descobrindo sem baluartes aqueles que amamos.
Há certas verdades que você deve descobrir sozinho. Há certas corroborações que não se pergunta a ninguém. Se você quer verdadeiramente saber, elas o encontrarão de alguma forma. Perfeitas e simplistas, se você realmente entender...

sábado, 27 de junho de 2009

Pequenos grãos de areia nas ampulhetas.

És um senhor tão bonito 
Quanto a cara do meu filho 
Tempo tempo tempo tempo 
Vou te fazer um pedido 
Tempo tempo tempo tempo...
Compositor de destinos 
Tambor de todos os rítmos 
Tempo tempo tempo tempo 
Entro num acordo contigo 
Tempo tempo tempo tempo...
E quando eu tiver saído 
Para fora do teu círculo 
Tempo tempo tempo tempo 
Não serei nem terás sido 
Tempo tempo tempo tempo...
Ainda assim acredito 
Ser possível reunirmo-nos 
Tempo tempo tempo tempo 
Num outro nível de vínculo 
Tempo tempo tempo tempo...
Caetano Veloso - Oração ao Tempo


Quem me conhece acha-me irônica. Sarcástica. Em verdade, eu bem o sou boa parte do tempo. Mas às vezes não. Digo simplesmente uma verdade que é irônica por si própria. E gosto das verdades. Não que eu me divirta com elas. Não. Até porque muitas delas tomam formas. Machucam. Inclusive a mim. Não estou ilesa a tudo isso. Mas gosto das verdades porque parte de mim precisa de uma ponta de realidade. Já disse aqui que gosto de passar boa parte do tempo imaginando, desconectando-me, mas isso não quer dizer que esqueço a realidade. O mundo, propriamente dito. Pois aquele que idealizamos, infelizmente, existe apenas costurado em nossas mentes, ostentado em nossos sonhos. Dia a dia, experimentamos o gosto amargo do real. Daí, você pensa, “essa garota é destrutiva”. Não sou. Admito ser ora pessimista, mas ora, inclino-me sobre o utópico otimismo. No entanto, não abro mão do realismo. Do mundo como é de fato. O sabor acre é uma conseqüência. Melhor: Uma indicação. Um indício de que já conhecemos algo mais. Que valha a pena. E então, estamos sempre buscando estas sensações. Tornam-se um motivo, para prosseguir. E mais: Se vivêssemos inocuamente, medíocres, não nos daríamos conta da dor. Pois esta só existe depois que experimentamos algo, tão fugaz como a vida é. Intensa: Felicidade. Mas não falarei explicitamente sobre ela. Não hoje. Comecei falando sobre ironias e verdades, e delas falarei a seguir. No post passado, falei sobre MORTE E CHOCOLATE. Pouco depois, - não sei se foram horas ou dias - disseram-me que Michael Jackson havia morrido. De súbito. O mundo perdeu o Rei do pop, de maneira imprevisível. O mundo chorou. A mídia repetiu zilhões de vezes os melhores momentos do cantor. E os escândalos, claro. As transformações de rosto, como sempre. Especulações. Defeitos e qualidades foram ressaltados nas diversas homenagens feitas por vários canais da TV aberta, internet, jornais. Dizem que ele se foi cedo demais. Apenas 50 anos. É deveras uma vida curta. Mas não é assim que gosto de ver as coisas, uma vez que ele fez parte de inúmeras gerações. São cinco décadas de inovação seja na música seja na dança. Michael Jackson cantava desde os sete anos de idade com o grupo Jackson’s Five. Lembro-me de ouvir esta banda desde nova. E sempre gostei muito de suas músicas, inclusive as de sua carreira solo. É inegável que seu trabalho fez parte da minha infância e até os dias atuais. Bom, ouvi muitos lamentos sobre a morte inesperada e protestos para que parassem de divulgar os escândalos da vida pessoal do artista. Nada disso me impressionou, já que está intrínseca à natureza humana a negação de uma verdade irrefutável: somos efêmeros, mas nem sempre nos damos conta disso. E temos facetas. Irônica e literalmente Michael teve várias. Sarcasmo? Não. Hoje não. Isso tudo me fez lembrar um livro. Há uma frase genial nesse livro, A menina que roubava livros, – e falarei muito mais dele – na qual a Morte - a narradora da história – diz algo que eu mencionei no post passado, daí a grande ironia disso tudo. Eis o trecho: “O ser humano não tem um coração como o meu. O coração humano é uma linha, ao passo que o meu é um círculo, e tenho a capacidade interminável de estar no lugar certo na hora certa. A conseqüência disso é que estou sempre achando seres humanos no que eles têm de melhor e de pior. Vejo sua feiúra e sua beleza, e me pergunto como uma mesma coisa pode ser as duas. Mas eles têm uma coisa que eu invejo. Que mais não seja, os humanos têm o bom senso de morrer.” É simplesmente genial. Essa frase sempre volta à minha cabeça, desde que li o livro: “os humanos têm o bom senso de morrer.” Certa vez, eu disse que morrer é uma eventualidade. Uma passagem, na qual esforçamo-nos para compreender a própria existência. (post A história explicada). E ouso mais: Morrer é fácil. Difícil é viver. Só por favor, não se precipite. Morrer é fácil para quem vai. Mas é difícil para quem fica. Para quem perde. Para quem vê outrem partir. Nunca disse que lidar com a perda é fácil, é eventual. É verdade que é certa. Inevitável. No entanto, dolorosa. Além do mais, se estamos sempre nos mostrando no que temos de melhor e de pior, chegaria um momento em que teríamos que decidir se somos feios ou bonitos, maus ou bons, e certamente não somos nem uma coisa nem outra. Somos os dois. Somos o equilíbrio de duas forças que nos constituem. Não existem vilões ou mocinhos, como os que você idealizou quando criança. Pensar assim é inocência demais. E somos complexos demais para nos resumir a uma coisa só. Somos compostos por partes antagônicas. Somos controversos, portanto, humanos. Por isso, não poderíamos viver muito. Seria cansativo. Até porque começamos a morrer a partir do momento em que nascemos. E outra: O ser humano é tão desastrado quanto parece ser. Sim. Busque na história. Quantos erros já cometemos? Quanto mal já causamos ao mundo? Erramos porque estamos simplesmente seguindo a ordem natural das coisas. Não conheço tal ordem, mas sei que ela existe. Basta olharmos para nós mesmos. Quantas coisas já fiz que me arrependesse? A enunciação “nunca me arrependo de nada” é bonita, mas é decididamente mentirosa. Aliás, outra coisa que fazemos por puro instinto, mentir. Mas essa é outra história. A questão é que os humanos são desastrados porque erram e se arrependem e podem continuar errando. Eu poderia aproveitar o ensejo para dizer que é isso que nos faz felizes, que nos torna únicos e mais sábios. Não, balela. Coleções de erros e arrependimentos não deixariam espaço para nossas virtudes. Nossos vícios e manchas – inevitáveis – se sobressairiam ao que somos de bom. Aperfeiçoaríamos nossas qualidades ao passo que concomitantemente moldaríamos também nossas patologias. Note-se que estou falando de Michael Jackson. Uma comprovação útil. Porque é uma pessoa pública. Porque foi alguém que teve seus defeitos – que em sua maioria não passam de especulações - e virtudes salientados. E acima de tudo, alguém que foi muito perseguido. Mas que resolutamente deixou sua marca no mundo.
Creio, que por tudo isso o tempo não nos é ininterrupto. É verdade que ele passa indiscriminadamente, talvez com pequenas influências, provenientes de nossas atitudes, do modo como vivemos. No entanto, ele cessa para nós. Esgota-se. Passará para cada um. E é isso que torna tudo interessante. Somos incitados a provar em tão pouco tempo, a todo instante, que nossa existência valeu à pena. Pois o tempo para os humanos é mais que a areia na ampulheta, é a própria vida.












Tributo a Michael Jackson.
Alguém que fez da vida autênticos passos de dança.

quarta-feira, 24 de junho de 2009

A roubadora de palavras.


O que somos além de nossas próprias palavras?
Que somos além da superfície? Além do mundo que nos completa.
Se sou palavra, me calo. Pois há momentos em que caminhar os passos que o mundo impõe é insuportável. Medonho. Se sou palavra, rabisco-me, pois, desaparecer parece muito mais simples que enfrentar a todos. Enfrentar-me. Céus, como é bom exilar-me numa história. Aventuras, romances... e esquecer todas as insídias que me cercam. Parece egoísta. Alienado. Mas até que ponto devemos nos importar? Talvez devêssemos viver aleatoriamente, como creio que a vida o é. Aleatória. Para alguém como eu, é muito melhor pensar simples. Pensar em cadeias de eventos interligados, predestinados, não é comigo. Questionar-me sobre as razões da vida já parece-me perda de tempo. Que dirá de indagações sobre como a vida se desenrola. Para alguns a vida é uma linha. É agora e ponto. Fim. Para outros, há mais. A vida é um círculo. Pensar na vida como um círculo é confortante, porém, controverso. "Para quê então tentarmos nos corrigir agora se virão outras chances?" Alguns pensariam assim. Ou, "tentarei fazer tudo melhor, na tentativa de ter uma recompensa, e quem sabe, me tornar perfeito?" Que diferença faz estarmos cônscios de tantas outras oportunidades se nós mal aproveitamos uma única? Nossa vida. Agora. Somos únicos hoje justamente porque não existiram outros iguais ontem. Repetir é chato. Entediante. Antecipado. Encarar a vida como uma linha é como imaginar um desenhista amador sem borracha à mão. É imprevisível. Podemos ter em mãos, como produto, algo medíocre. Ou, algo genial. Imagino-me esse desenhista grotesco que treina rabiscos todos os dias. Às vezes faço pinturas vulgares, às vezes, faço artes finais. E quando estou cansada e desiludida ponho-me a fitar o horizonte. Fitar o céu. Busco as formas. Buscando respostas. Vez por outra, só inspiração...

Disse aqui certa vez que gostaria muito de falar sobre um livro, o qual ficou fortemente em mim. A menina que roubava livros. Isso acontece com quase toda história que leio. Já que é lá que estão elas... As palavras. É lícito admitir que as roubo. De cada livro. Quero sempre uma nova. Desconhecida. Quero lê-las – todas – e usá-las. Entender todos seus significados e dispor de cada um deles. E não vejo problema nenhum nisso. Busco- as. Absorvo-as. Alimento-me dessa matéria impalpável. Digeri cada uma delas. E agora, sinto-as em minha superfície. Formando o que sou. Constituindo as minhas concepções, estúpidas indagações...



Eis aqui um trecho favorito:

MORTE E CHOCOLATE

Primeiro as cores.
Depois os humanos.
Em geral, é assim que vejo as coisas.
Ou, pelo menos tento.

EIS UM PEQUENO FATO
Você vai morrer.

Com absoluta sinceridade, tento ser otimista a respeito de todo esse assunto. Embora a maioria das pessoas sinta-se impedida de acreditar em mim, sejam quais forem meus protestos. Por favor, confie em mim. Decididamente, eu sei ser animada, sei ser amável. Agradável. Afável. E esses são apenas os As. Só não me peça para ser simpática. Simpatia não tem nada a ver comigo.

REAÇÃO AO FATO SUPRACITADO

Isso preocupa você?
Insisto – não tenha medo.
Sou tudo, menos injusta.

...

UMA PEQUENA TEORIA
As pessoas só observam as cores do dia no começo e no fim,
mas, para mim, está muito claro que o dia se funde através de
uma multidão de matizes e entonações, a cada momento que passa.
Uma só hora pode consistir em milhares de cores diferentes.
Amarelos céreos, azuis borrifados de nuvens. Escuridões enevoadas.
No meu ramo de atividade, faço questão de notá-los. ”[Fim do trecho].





Um desfecho, um conselho:

Quando um dia, tu vires alguém lendo, num canto, hermético, só, deixa-o lá. Por mais solitário que pareça, não interrompa alguém que lê. Este alguém pode estar se divertindo muito mais do que você. E pode estar mais feliz que você. [nota minha].




Ouvindo: Colbie Callat e Jason Reeves _ Droplets.

sexta-feira, 15 de maio de 2009

Enunciação minutíssima.






Creio que depois do último post tive um acesso de afasia... Senti as palavras me escaparem fugazes. Espero que hoje eu possa acariciá-las docilmente, mais uma vez. Mesmo que pusilânimes. Efêmeras. E aqui estou, em mais uma das minhas vãs tentativas de explorar por meio de palavras, tudo o que se passa em minha mente. Na tentativa de “dissecar” toda a matéria que me invade, ao que sinto, cada dia mais. Tudo o que se passa por esse mundo aí fora... Que me entorpece. E me assusta. Andei muito pensativa. Introspectiva. Perdida. E ainda o estou. E espero que isso se reflita em cada palavra mal rabiscada que enuncio hermeticamente no papel amarelado, no desespero das mãos trêmulas. Hesitantes. ... Sim, hesitantes, é assim que me sinto ultimamente. Hesitante quanto ao poder que outrem tem de ferir. Daí, o silêncio vem como a melhor solução. Silêncio este que se encerra dentro de mim. Pois há um som dentro de mim. Ou melhor, vários. Ecoando. São as pessoas. Todas elas. É o mundo. Não posso registrar tudo isso com só duas mãos. Dez dedos. Uma mente. Um coração. É demais. E por ser demais escreverei de menos. Em protesto. À minha confusão. Ao mundo, por ser exagerado. Às pessoas, impossíveis de decodificar. Ambos me cansam com todas as suas ricas particularidades.
NOTAS DE QUEM ESCREVE:
Não adotei, ainda, a reforma ortográfica.
Não tencionei nenhuma das rimas.
Ouvindo: "Sunrise" - Norah Jones.

Fim de um post minutíssimo.

sábado, 2 de maio de 2009

Uma vil verdade.



"A verdade imita a ficção...
E a ficção, simula a verdade..."


Eu não sou do tipo de pessoa que acredita em destino. Eu prefiro a aleatoriedade à idéia da onipotência desconhecida que designa nossas vidas... No entanto, há certas verdadezinhas que me fazem entrar em transe. Em um conflito imensurável, sobre o que é a vida, afinal. E se de fato, certas coisas acontecem porque tinham que acontecer. Bom, digo isso devido a uma sucessão de fatos que se desencadearam de tal forma que me senti inclinada a perceber uma realidade. Eu poderia deixar suspensa essa realidade, pendurada nas entrelinhas, mas não sou do tipo que faz mistério. Prefiro mencioná-lo agora. “O quê”, primeiro. Depois, “o como”. Acho muito mais interessante. É sobre uma concepção simples, corrente, que percebi a pouco, o quão vem sendo deturpada. É sobre o seguinte: Amor. Nem preciso, de fato, estar encarando o meu presente enunciatário para imaginar um muxoxo em sua expressão. Uma manifestação de desdém. Pois a introdução pode ter parecido muito mais simpática do que o assunto,sobre o qual pretendo abordar. Mas como eu já disse, o “o quê” nem sempre importa. Este pode até tomar proporções fastidiosas. Mais intrigante mesmo, é “o como”. Vou lhe contar...

Eu terminava de ler um romance policial, - Agatha Christie -, quando fui interrompida por uma pergunta que naquele momento soou um tanto inusitada: “Você vai fazer?” “Fazer o quê?” Perguntei. “Ora, a redação. A professora acabou de passar a proposta.” O tema era deveras interessante. “Narrar um marco em sua vida”. Mas, a proposta mais parecia um tema avulso, e intrínseco havia um subentendimento: “Se virem”. Bom, eu decidira que não faria a redação. Infelizmente, eu tenho uma inabilidade de fazer redações de origem acadêmica. Principalmente, as quais não havia uma proposta que realmente direcionasse o tema pedido. Eu não sei fazer nada sem um norteamento, e decididamente, algo de caráter concursivo. Por fim, esqueci a história.

A minha vida resumi-se a uma coisa: Estudar. Bom, ou deveria resumir-se a isso. Porém, sinceramente, não o faço da forma que gostaria de fazê-lo. Apesar de ser isso o que eu quero fazer para o resto da minha existência, creio que não o exerço com diligência. Estudar. Faço-o de várias outras formas, não convencionais, mas que são resolutamente mais agradáveis. Por exemplo, gosto de estudar as pessoas. Pode até não parecer, já que sou indiscutivelmente distraída. Assumo a minha distração. Sempre cri que ela faz-se necessária. A desatenção do mundo que nos cerca, para fitar nosso mundo, e só assim então, compreender o mundo exterior. Este último é a matéria que nos completa, mas não, a que nos compõem inteiramente. Precisava ressaltar isso. E assim, observo. As pessoas... E já notei uma regra neste grupo, do qual faço parte. Não há exceção. Todos são impulsionados pelo motivo. Vivemos em busca deste. Ansiando, procurando-os, em outras coisas, para aqueles que são mundanos, ou em outras pessoas, para aqueles que são românticos. Há aqueles que possuem um comportamento dual. Ora, mundano, ora romântico. São estas facetas que nos tornam complexos, e os motivos que nos substanciam. Foi perdida nestes pensamentos que me lembrei da proposta,a qual tornei-me relutante a aceitar. Lembro-me que o pouco que me sujeitei a pensar na proposta cheguei à conclusão de que não tenho nenhum marco na minha vida. Uma justificativa conveniente: Sou nova. Tenho muito em frente, ainda. No entanto, creio que levei esta proposição, “narrar um marco em sua vida”, numa perspectiva muito pessoal. Ludibriei-me. Naquele momento, não havia passado por minha cabeça que este marco não seria necessariamente algo que me ocorreu, de fato. Mas, qualquer situação, que por mais vil parecesse, e não obstante, tivesse inerente a ela um significado. Uma liçãozinha. Uma qualquer, que se deu em minha vida. Em meu círculo de amizades. As pessoas que fazem parte da minha existência. Incitei-me a uma coleção de lembranças, observações. Nada. Nada? Sim, por mais que eu buscasse na memória tudo o que me aparecia eram casos, que sinceramente mostravam-se frívolos demais, quais até tomavam proporções vulgares. Um exemplo de um que me chocou. O relacionamento que alguns conhecidos meus levam. Ao que parece-me, há um conceito – moderno -, corrente, sobre relacionamentos. Cito “relacionamentos”, como sendo a ligação íntima, amorosa entre duas pessoas, sejam de sexos opostos ou não. Não entrarei em detalhes em questões de orientações sexuais, mas, digamos que de valores, os que constituem tais relacionamentos. E ouvindo casos de traição mútua, e a sua respectiva aquiescência, também recíproca, que percebi o quão banalizados tornaram-se os relacionamentos de hoje em dia. Outro dia, ouvi um comentário com um perfil que se enquadra neste mesmo paradigma “moderno”, sobre namoro, relacionamento, - preferirei o uso deste último, pois generaliza de forma mais satisfatória -. E bem, segundo o que foi dito pelo enunciador, ele não se importa de ser traído, contanto (!) que ninguém soubesse. Ou melhor, somente eles – o casal em questão -, poderiam saber, ninguém mais. Resolvi perguntar o porquê disso, o que pareceria muito óbvio, mas o fiz na tentativa, apesar de achar um absurdo, de mostrar interesse, tentar compreender. Então, o indivíduo disse-me que não gostaria de ser ridicularizado, que fizessem escárnio deste, acerca desta situação. Então, passei a refletir sobre todas essas eventualidades... Cheguei a uma conclusão. Uma conclusão que ainda está amadurecendo dentre outras concepções que me constituem. Percebi uma verdadezinha, que para mim não foi muito agradável. Compreendi que os relacionamentos não são mais substanciados com sentimentos, e estes corroborados a partir das atitudes. Não. O que acontece agora, a rigor, é que todos os aspectos que formam a união de duas pessoas transformaram-se em representações. Encenações diante da sociedade. Do mundo que os cerca. Há uma inversão da ordem – que tornaria sincero -, aquilo que se vive. Ao invés de os fatores que cercam a convivência, partirem de algo interior – sentimentos como, respeito, confiança -, e refletirem-se – por pura conseqüência – externamente, o externo, é que é inicialmente observado. Posto em prioridade. Compondo o que há entre duas pessoas, que tencionam compartilhar... O quê? Desconfiança? Desrespeito? Sinceramente, nego-me aderir a este novo prisma. Deturpado. Isso não é amor. Não ao outro. No máximo, amor a si mesmo. No máximo, uma busca fútil pela aprovação alheia, - acompanhado de um anseio insaciável, de sentir-se satisfeito consigo mesmo -, dentro de um relacionamento medíocre.

Agora já chega. Você deve estar se perguntando, senão concluindo, que estou ficando velha, louca, e que não sei ordenar meus pensamentos, conjecturar idéias, e que esqueci o meu fito, o meu objetivo principal, o qual iniciei essa conversação. Pergunte-se: “O que tudo isso tem a ver com um marco na vida de alguém??”. Eu disse que “o como” é muito mais interessante do que o “o quê”...
Bom, entendo que a forma como estou abordando as coisas, além de cansativas, podem causar tamanha perplexidade. Mas juro que chego lá. Só não garanto que valerá a pena. Porque isso depende do que você deseja ouvir. Francamente, não estou aqui para dizer verdades veladas. Agradáveis. Estou aqui dizendo o que eu vejo. Não necessariamente com os olhos. Mas projetando realidades, que comprovarão o que venho dizer. Nem sempre sou assim. Mas hoje sim.
Gostaria de ter uma citação que simplificasse o que pretendo dizer conseguintemente, mas, nenhuma me ocorreu. Então, direi eu mesma. Digo que, vivemos em meio à opulência, de pessoas, sentimentos – o qual nos poupamos, às vezes, de entregar verdadeiramente porque somos vaidosos ou tolos demais -, dentre milhares de coisas, vivemos numa imensidão de probabilidades, e às vezes não nos damos conta disso. E sabe por quê? Porque perdemos a noção do simples, do humilde. Não sabemos mais o que é vil, mesquinho, e por isso, às vezes, o somos, sem perceber. No entanto, acredito que há um vil, que se aproxime do simples, qual vale a pena lançar um olhar...

UMA PEQUENA EVENTUALIDADE:
Eu caminhava por algumas ruas, qualquer dia, numa hora qualquer, - estes, pouco importam -, “o quando” e “o como” pouco interessam agora. Por hora, aceite “o quê”. O que eu vi. Eu vi dois mendigos. Um homem, uma mulher. Fitei-os. Resolvi observá-los discretamente. Acho que nunca vira antes, um casal de mendigos. Deve ter sido por isso que parei. Não literalmente. Mas sei que parei. “Ele” se aproximava do lixo que havia ali e debruçou-se sobre ele. Entrou em algo que parecia ser uma investigação. Uma perícia. Obviamente, procurava comida. Para ele, e supus, para a mulher. Enquanto o mendigo procurava, lançava um olhar confiante para a mulher abatida e taciturna, que o fitou de volta e aguardava, paciente. Havia naqueles olhares uma troca de imensa afinidade, compaixão... De salto, ele tirou algo, dotado de animação, que parecia ser uma marmita. Estava praticamente intacta. Provavelmente estragada. E com um leve sorriso de satisfação entregou prontamente à mulher, que transformou sua expressão abatida, por uma mistura de olhar faminto e esperançoso, e culpa, pois não quis devorar abruptamente a comida. Ele balbuciou-lhe qualquer coisa, ela, um pouco relutante, começou a devorar o achado, enquanto ele retornara à procura de “um novo achado” em outro lixo, não muito longe dali. Não demorou muito, e encontrou meio cachorro quente, que com certeza, estava frio, naquele momento. E como se fosse seu dia de sorte, ele caminhou a passos largos e veementes, para perto da mulher. Sentou-se animado, beijou-lhe o rosto, esta correspondeu, e puseram-se a saciar a fome.

Eu não sei, havia algo de nobre naquela cena, que, à vista rápida, seria desprezível, triste demais... Eles não pareciam tão tristes... Estavam sim, abatidos. Mas, com certeza, satisfeitos. Um, por ter-se feito herói, por saber que fez alguém feliz, mesmo que sutil e efemeramente. Outro, por sentir-se seguro, por sentir que alguém zela por ti, e que é amado. E que é correspondido.

Fiquei pensando naquela cena, tão depauperada, vil, porém, tão mais nobre do que qualquer outra que já presenciara. Uma briga num shopping. Uma discussão extenuante em que se procura culpados por um erro cometido. Desrespeito. Ou até mesmo um silêncio doentio. Desconfiança. Ou a simples indiferença quanto a todas essas coisas. Pois se são só papéis representados, pouco importa, se quem o dirige é a sociedade, que é diretor e telespectador.

E ainda quando vejo estas personagens por aí, se vestindo de moral e romantismo dissimulado, onde se tem como mero figurante, o “Amor”, incorporado de forma ignóbil e sórdida, lembro-me daquela cena, esperando encontrá-la em rostos jovens, o retrato do que foi para mim, apesar de simples, muito nobre, real, e sincero. Este foi o marco da minha vida.


Escutando: Beirut - "Elephant Gun"...


Pintura: "Dança na cidade", Renoir.

quinta-feira, 30 de abril de 2009

Um fato supracitado.




Eis a minha válvula de escape. Semi- aberta. Permitindo a ligeira passagem de uma matéria. Ela não é líquida. Não é gasosa. Nem sólida. Creio que possua um comportamento irregular. Ora líquida, ora gasosa. Ora sólida. Ora lacônica, ora prolixa. Redundante. Por vezes, todos os estados. Às vezes dual. Intrinsecamente arbitrária... Nunca se sabe...



Certo dia, estava perdida em meus pensamentos... Fitando o horizonte. Mas não o que jazia em minha frente. Vislumbrava algo mais colorido. Estava no meu momento de projeções. Vou explicar o que são as minhas “projeções”. Eu tenho uma teoria. Não tão minha, visto que já existe. E milhares de pessoas no mundo, – ainda assim poucas -, a adotam como uma filosofia de vida.
Segundo a teoria, minha, - nossa -, podemos concretizar todos os nossos pensamentos. É como se em algum lugar seus desejos são registrados e encaminhados. Mas é preciso acreditar neles, acreditando, a priori, em você mesmo, é claro.
E bom, eu estava no meu momento de imaginar. Sim, imaginar. Simplesmente debruçando-me sobre uma multidão de possibilidades. Oportunidades. São tantas. Daí, eu percebo o quão opulento o mundo é. Encaixam-se quase que perfeitamente. “Posso ser tudo.” “E posso ser nada.” Depende do que os meus pensamentos projetam. Para onde me levam. Já disse aqui que palavras é a materialização de tudo – ou quase tudo – que se passa em nossas mentes. É claro que há pessoas que transformam ao oposto estas torrentes de idéias. Deturpam. Por vários motivos... Por não terem a simples capacidade de exercer sua própria franqueza. Ou porque de fato não é conveniente, já que a verdade às vezes torna-se um utensílio empedernido. Laborioso. Que fere. Mas não entremos em pormenores quanto às questões de “verdade genuína”. Voltemos a uma verdade mais agradável. A verdade que criamos para nós antes mesmo de ela se tornar real. Essa verdade doce. Impalpável. Mas conveniente. E quer saber de uma verdade surpreendente? Os pensamentos se materializam muito além do que só palavras. Então, pense. Por mais absurda que pareça a idéia, aceite-a. Imagine. Eu sempre fiz isso. A minha vida toda eu imaginei. Depois vivi. Vivi e imaginei. Sonhava acordada. Ainda o faço. E muito. Mais do que deveria. Outro dia, uma amiga disse-me que sou muito distraída. Que percebo quase nada. Um short. Um comentário. Até mesmo um grito. Este último, provavelmente porque estava de fones de ouvido. Em outro mundo. Quanto aos outros há uma explicação. Eu realmente não observo tudo. Disse a ela o que já disse aqui. “Observo tudo de um pouco. Distraidamente.” Parece-me mais emocionante. “Reparar as cores. Depois os humanos”. Notar o que observam. Mas a maior parte do tempo eu estou imaginando. Projetando-me. Em vários lugares. Em outras histórias. Outras personagens. No fundo, somos todos personagens. Muitas vezes representando. Ou sempre. Se fôssemos aquilo que somos em essência, seríamos estranhos. Seríamos várias facetas em um só instante. Não acredito que isso nos torne menos verdadeiros. Não. Simplesmente não ouso afirmar que somos constantes. Uniformes. Pois entraria em paradoxo com algo que somos irrefutavelmente. Complexos. Assim como nossas mentes e anseios. Estou satisfeita com a minha vida, mas é quase incontrolável a minha necessidade de imaginar. Eu paro para tal. “Licença, vou ler um pouco.” Ligo a caixinha de músicas. A caixinha que me torna hermética. Qual torna tridimensional todas as minhas estórias. Talvez possa parecer que sou um tanto arrogante. Alheia demais. Que não gosto das pessoas. Serei excessivamente sincera. As pessoas são quase como as palavras. As amo e as odeio. São materializações. Somos mil páginas a ler e decodificar. Não obstante, podem tornar-se dissimuladas. E pior, podem jogá-lo em uma teia de mentiras e incitá-lo a fazer parte desta representação, pérfida. Claro, que sou como todos. Não me excluo deste todo. Talvez seja eu quem não é capaz de se esquivar de todas as idiossincrasias destes que se mostram para mim. Absorvo-as? Não sei. Talvez seja uma inegável inabilidade de entendê-las. Porque não me entendo? Provavelmente. Ou simplesmente incapacidade de conter-me. Não amá-las tanto, tornando-me vulnerável. Suscetível a decepções. Desde aí faço da distração as minhas férias de toda a complexidade de que as pessoas são providas. E desta distração veio um labor, contraditório. Agradável. Reflexões. Íntimas e silenciosas. Todas em minha mente cantam em uníssono. Disse “contraditório”, pois há um conceito de distração: “irreflexão, divertimento,” dentre outros. Mas quando cito “distração”, refiro-me a desatenção daquilo que faz parte do externo. Neste momento, eu não noto as cores. Nem as pessoas. Mas sujeito-me a visão dum caminho. Um caminho que percorri. Que percorrerei. Sou uma mera transeunte que procura veredas. Passeio sobre meus pensamentos. Inclino-me sobre as possibilidades supracitadas. E então faço a escolha. Independentemente desta escolha, sei que vale a pena esquecermos um pouco do mundo que nos cerca, e pararmos para fitar o nosso mundo. Talvez assim, tomemos para as nossas vidas, decisões mais sapientes. Não aquelas que seriam as convencionais. As decisões correntes. Não, não, não. Não siga a corrente. Não se prostre diante das dificuldades, elas vêm primeiramente de seu interior. E nunca volte. Sim. Foi pensando todas essas coisas, uma noite antes de dormir, que cheguei a esta conclusão. Seguir em frente é essencial. Já vi muitas pessoas pararem. Nenhuma objeção, contanto que seja uma breve estacionada para uma manutenção oportuna. Mas voltar... Não. Pois a vida é só uma passagem. Fugacíssima. Pois retroceder não é seguir contra a corrente. É simplesmente percorrê-la mais uma vez, inutilmente.

Voltar...  


Por que não voltar?
“Porque eu passei devagar demais por todo esse caminho...”
Por que não voltar?
“Por que já passou...”
“Sigo em frente...”
Por que não voltar?
“Porque as horas não voltam.”
“Porque o ponteiro do relógio pode até passar pelo mesmo ponto duas vezes. Mas ora de dia, ora de noite.”
Porque não voltar?
“Porque já fiz pausas demais... E ainda tenho todo um caminho para seguir em frente.”
Por que não voltar?
“Porque o tempo é incessante.”
Por que não voltar?
“Porque as lágrimas secaram, mas sequer uma voltou.”

“Não posso voltar...”

“Porque meus cabelos não decrescem, minhas rugas enlouquecem, meus olhos enrobustecem, meus cílios envelhecem, minhas unhas entorpecem. E quero retroceder todos os pesares mil vezes sem que estes nunca cessem.”

“Por que não voltar?”

“Porque é rima demais. Porque é repetitivo. E não faz sentido.”


Escutando: John Mayer – “Daughters” etc...

domingo, 26 de abril de 2009

A quintessência da história


"Enfim,
Nu,
Como vim"



e
as
palavras...








Há algumas coisas a mais que eu gostaria de completar aqui. É sobre um post meu. "A história explicada". Aquele parecia um final conveniente. “Enfim, nus, como viemos.” Entretanto, quando o fiz, sabia que eu não havia atingido o meu fito decisivo. O meu objetivo crucial. Havia uma sensação de algo inacabado... um quê de reticências... Mas as deixei subjugadas, pairando no ar por um tempo. Esperando que essas reticências se concretizassem... Então pensei que seria bom citar algumas idéias – que naquele momento ainda não estavam maduras e agora talvez seja o ensejo -. Eu não forço a barra. Eu deixo as palavras me alcançarem. Docilmente. Daí você perguntaria: O que isso tem a ver com o modo como partiremos? Bom, a princípio, nada. Mas as palavras têm tudo a ver com este blog, o qual alcunhei “Enfim, nu, como vim.” Sinceramente, não esperava que as palavras fossem aparecer tão sobejantes. E elas estão aqui por um motivo. O mesmo que já citei, o qual procuramos. Uma corroboração dos fatos da vida. Eu tenho uma sensação muito única quando venho aqui materializar meus pensamentos. É como se fosse uma configuração, um arquivamento de tudo o que se passa em minha mente. E há esse haicai, “Enfim, nu, como vim”. A resposta. Vou lhe dizer o que a morte tem a ver com as palavras. Eu estou aqui, desataviada, com esta carne que me encapa... Sinto-me uma matéria que logo estará a sete palmos e... bem... você e eu sabemos o que acontecerá... não haverá mais carne... roupagem... fútil... seremos aquilo que somos em essência. Nus. E quanto a isso estou segura. Mas sobreviverá algo... perdido... preso em alguma linha, pendurado na ponta duma caneta... no espaço, saindo de uma boca...registradas aqui, estarão as minhas palavras... essas perenes palavras... humildes... bestas... e às vezes, admito, pedantes. Todas fazem parte de mim. Constituem o meu “eu” nu, puro, despido, sem gala e adornos. E por mais ridículas que sejam as minhas palavras, são o que eu mais amo em mim. Palavras, - as "ecoarei" bastante aqui -. É aquilo que eu gostaria que mais se mostrasse em mim mesma. Sei que nem sempre são inteligíveis... Mas quem disse que eu quero ser tão facilmente compreendida? Como uma face tão logo é, decodificada. Bela ou não. Essas palavras herméticas refletem-se neste rosto patético? Eu gosto de traçados, formas, linhas, mas as que formam letras... gestos, expressões que constituem palavras... as prefiro à face que se revela. Que nos engana. Ludibria. Incita a uma ilusão. Eu sou uma face calada... Porém há palavras além da pele que reveste. Desta matéria que se decomporá. As palavras não. Enquanto minha face, um dia, estiver a sete palmos de terra, as minhas palavras, hoje, estão a sete palmos de matéria: Eu. Elas brincam, escondem-se, recolhem-se, e às vezes se mostram veementemente. Confusas, vêm à superfície, penduradas em minha boca. presas em meus olhos, soltas em minha mente. Palavras podem tocar-lhe de alguma forma, os fazem chorar, rir. Enfim, sentir... Ao passo que, a face é só um reflexo. Um figurante. A palavra é protagonista. A face, o corpo sem palavra é nada. É vácuo. Escuridão. Sem som, sem tom, sem texto, sem falas, imóvel, cheio de atavios, mas tão vazio! A palavra é o que completa, verdadeiramente. Não me imagino sem elas. E não se iluda. Refiro-me a todo tipo de palavra. Inclusive àquelas que não são ditas. Inobstante isso, ainda assim, elas estão penduradas nos olhos, subentendidas, suspensas no ar. Faço alusão também às que são ditas e, no entanto, não constroem algo eloqüente. Eu gosto daquelas que cantam, beijam, dançam...
Há as que mentem. Não as condeno. Todos mentimos, afinal. Pura condição humana. Tão forte quanto tão fraca é a carne. As palavras já foram usadas para persuadir todo um povo, na perseverança onírica de se conquistar o mundo. Com ideais que machucaram, mataram. Sim, mataram. Destruíram. Tão grande é o seu poder. É por isso, que há quem as odeie. É por isso que há – principalmente – quem não as mereça... Inegavelmente, porém, elas pertencem a todos. Guerra é uma das conseqüências que elas podem causar. Palavras são a materialização fiel das idéias. E como diria um personagem fictício, - por quem tenho grande admiração -, "idéias são à prova de bala", ("V de Vingança"). Palavras são à prova de bala. - Desculpem o romantismo exagerado -. E está em nossas mãos, em nossas bocas e corações o uso que faremos delas...
Bom, hoje eu tenho consciência da importância das palavras... E para mim elas são imortais, coisa que não sou. Mas quero partir me lembrando de todas que proferiram o quão importante é/foi minha – sua, nossa – existência. Na tentativa de imortalizar não a existência, mas as lembranças que nos tornaram únicos.

terça-feira, 21 de abril de 2009

Devaneios oníricos.


UMA INTRODUÇÃO:

Um comentário a um texto. Um texto, um monte de palavras que já existiam, as quais pus numa seqüência que somente eu faria como fiz. Desculpe a possível confusão. Sou assim. Às vezes. Sei também ser muito clara. A propósito, eu tenho um lado, no qual eu sou – constantemente - muito “clara”. É quase inevitável. Este lado esteve comigo toda a minha vida. E por favor, não confunda a minha afirmação inicial: “Um texto, um monte de palavras que já existiam, as quais pus numa seqüência que somente eu faria como fiz”, com presunção, - não, eu posso ser tudo, menos presunçosa -. Isso, é óbvio, se foi possível entendê-la. Não o condeno por isso. Estou cônscia de que muito do que escrevo é de caráter totalmente particular, tomando, às vezes, proporções pessoais demais... De entendimento unilateral... E por isso: "somente eu o faria como fiz"... Também não faço questão de ter um leitor. Escrevo como que para alguém, mas não anseio pela leitura de outrem. Achei que seria bom ressaltar isso aqui. Parece paradoxal, pois todo escritor precisa de um leitor... Será mesmo? Pergunto-me. Se sim, sou mais que uma escritora, - e uso “escritor (a)” no sentido comum, banal da palavra, como sendo alguém que simplesmente escreve -; ao passo que, não necessito de um leitor. Mas isso não quer dizer – pois não foi o que disse aqui – que você – não importa quem – desempenha um papel inútil e frívolo. O caso é que eu só não espero a presença de um leitor por estas bandas... No momento, busco a simples exteriorização de algumas coisas que passam... Observo. Julgo. Algumas já estão intrínsecas a mim, observo, julgo e deixo passar. “Isso” são pensamentos. A causa. E, então, vêm as palavras. "Essas" são os meus pensamentos se materializando. São a matéria-prima. Elas são a conseqüência. Daí o meu texto.
A princípio, não gostei. Não sei o porquê. Por mais sinceras que tivessem sido produzidas as palavras que estruturaram o que eu acabara de fazer - um texto/redação -, houve "um quê" de rejeição. Desculpe a rima, - e todas as outras, não as tencionava! - Enfim (!) Decidi que não colocaria aqui, meu texto. Mas, depois de relê-lo e escutar uma perspectiva diferente, comecei a vê-lo com outros olhos. Peguei-o numa perspectiva mais... sei lá. Também não sei o porquê. Só sei que o vi com uma perspectiva que não tão grotesca como tinha concluído inicialmente.
Também não sei ao certo qual gênero literário deveria alcunhar o meu texto. Dizem que é o autor quem escolhe. Ponto. Chamei-o de "crônica", não obstante a crônica tem relação com a idéia de tempo e consiste no registro de fatos do cotidiano. O que não se enquadra com o meu texto. Acho até que há nele predominância de anacronismo. Porém (!) há pontos em que poderia entrar no perfil de "crônica lírica", pois narra com nostalgia e sentimentalismo... Definitivamente, não domino bem as sutis diferenças entre determinados gêneros literários!
De qualquer forma, ao compulsar melhor sobre outros tipos literários - tipo: gênero. Muitas repetições aqui! -, pude encontrar suficiente identificação com o gênero "conto", por sua subjetividade, descrição pormenorizada de emoções... Tudo bem, que é deveras um conto minutíssimo! Mas não encontro algo mais satisfatório. Denominações literárias é a pedra no meu sapato.
UMA INSPIRAÇÃO (IN)CONSCIENTE:
Acredito na Teoria da Intertextualidade, a qual afirma que não existe um só texto que não tenha inerente a ele outro texto. Um resquício. Um conceito. Esta é a palavra-chave: Conceito.
A inspiração é uma conseqüência do impacto que determinadas coisas lhe causam. Elas ficam. E há uma que está em mim ultimamente:
“A Menina que Roubava Livros”... Desde que o li, tenho um novo conceito sobre a morte... E conseqüentemente, sobre a vida, dentre milhares de outras coisas, sobre as quais espero voltar a falar, mais tarde... Já que estas me acompanham em tudo o que escrevo.


Devaneios oníricos

UMA PERSONAGEM:
Uma menina.
Ela sonhava naquela noite. Um sonho quase consciente. Úmido. Quente. Era uma noite fria.
Gélida. E suas mãos tremiam. Começara a chover de leve. Lentamente caiam as gotas d’água. Logo, alcançaram-na. Corria-lhe as maçãs do rosto. Eram quentes. Tocaram-lhe os lábios. Era salgado. Um gosto conhecido. Comum. Maldita chuva. Relutante. Por que, Deus, sentia tudo do modo como sentia? Céus, tudo tão forte em seu peito. Úmido, queimava-lhe. “Coração não sente! Coração só bombeia sangue! Só!”... Por que, então, começara a ouvir tambores em meio à chuva salgada e quente? ...seria um ritual inusitado?... Malditas batidas! “Tum tum tum”... Chegavam a seus ouvidos, enlouquecendo-a. Ela nunca gostara daquelas batidas. Insistentes, Intrometidas. O céu embaçara de repente... Seriam as nuvens? Aquele céu... Aquelas estrelas... Produziam-lhe uma sensação inefável... a deixara embasbacada...mas agora mal conseguia contemplar aquele espetáculo de luzes...A chuva começara a cair com mais intensidade. Trovões. Luzes. Havia nuvens demais, brumas cobrindo seus olhos. Nuvens. Gotas salgadas. Em verdade, eram mais filetes aquosos do que gotas. Eterna umidade. Sua face – estúpida – encharcara. “Caminhe”. Foi em direção ao mar. “Suas palavras não fazem sentido.” Mergulhe então. Tambores. Encontraram- na, mais insistentes do que nunca. “Coração só bombeia sangue.” “Então se livre dele se não gosta das batidas.” Não eram batidas de júbilo. Jaziam intermitentes. “Caminhe para o mar e deixe estar...” Agora sentia aquela água todo fugaz... Salpicava-lhe os lábios... que figura grotesca formava aquela garotinha, numa noite tão linda, e tão fria...Que lúgubres olhos, outrora reluzentes, agora tão embaçados. Opacos.
UMA NOVA PERSONAGEM:
A Noite.
A Noite sussurrava-lhe: Sente as batidas? Elas são você. Elas lhe dizem o que fazer. Elas a norteiam. E você esteve relutante. Mas aqui, nos seus sonhos, eu digo o que verás. O que sentirás... Um sabor dulcíssimo... Você sabe, você já o sentiu não é? O sabor doce também acompanhou as batidas... Você até sorrirá. “Não cederei.” Não adianta. Quando essa sensação chegar sentirá felicidade. “Golpe baixo.” Já viu alguém resistir a uma tênue sensação de felicidade? “Não.” Não. “Injusto.” Confusa. Fite o mar e veja seu reflexo, há um sorriso. “Mas me sinto afogar!” “Como posso sorrir se estou enlouquecendo com estes sons cacofônicos?” “Como me sentir feliz se minha razão torna-se inaudível?” A Noite não respondeu. Emudeceu. “Sinto tudo tão causticante e você me fala de felicidade. Sinto essas batidas patéticas.” “Alumbro-me, e percebo uma débil sensação doce. Fecho-me, estou segura, mas sinto o sal, quente e molhado. Torpor. Completa inércia moral.”

DUAS PERSONAGENS E UM DESFECHO:
Tempestade. O céu parece arrebentar. Mas a Noite jazia imóvel. Frígida. E a garota também. “Sinto-me...” A Noite interrompe. Não entendo por que vens exaltar-se comigo. Protestas do que sente? Então reclamas de estar viva... (?) Se este é o problema, vá exclamar à Morte. Esta infeliz que já tem problemas demais, pobre coitada. Tantos humanos queixam-se da dor. Procurando culpados. Vociferam da mais pura sensação de viver, enquanto a Morte carrega todas essa almas frias. Tentando inutilmente aquecê-las, ao passo que, os que sentem o ardor queixam-se, buscam a inexpressão. A impassibilidade. A morte de seus fragmentos que os tornam vivos. Garota, não reclame desta umidade cálida em sua face. Desconfortante. Pior é uma face inútil e fria. Agora, acorde e agradeça ao Sol, pois conheço a ingratidão humana. Nunca agradecem a mim. No mínimo, ao Sol, que os fazem sentir o calor. Ignoro a razão disto. Deveriam agradecer a mim. Sou eu quem mostra que o calor que sentem não vem daquela esfera eterna de lume. Não. Do contrário, não estaria lastimando-se paradoxalmente da Noite álgida que sou... Dessas batidas calorosas e grotescas. Que os perturbam. Este calor infindo vem de você mesma garota estúpida. Das suas lágrimas capazes de enublar-me! Acorde e veja por si mesma o quão transpira, só por causa de um sonho, uma Noite sonhada, algumas lágrimas e outras batidas, intermitentes. Serão assim, enquanto jazer com vida.


sexta-feira, 17 de abril de 2009

A história explicada...






"Há uma história aqui."


Vou lhe contar...
"Enfim,
 Nu,
 Como vim"

do poeta Paulo Leminski, é um Haikai, Haiku ou Haicai. É uma forma poética que consiste em três linhas, de origem japonesa que valoriza a concisão e a objetividade.



UMA INTERPRETAÇÃO:
- Uma pequena observação de caráter personalíssimo. -
Há uma verdadezinha. Um fato. Irrefutável. Você e eu morreremos. E sinceramente, não entendo o porquê de esse evento ser visto como algo tão funesto. Como já citei, trata-se apenas de uma eventualidade. Inevitável. Uma passagem, na qual esforçamo-nos para compreender a própria existência. Buscamos a resposta. Ansiamos pela comprovação. Alguns olham para as estrelas, outros encontram conforto nas coisas mundanas. Há aqueles que preenchem-se com a aprovação alheia. Seja esta na proporção da inteligência, seja na proporção da beleza, o que nos impulsiona é o motivo. Isso é “o quê”. Depois vem “o como”. Como partiremos? Descalços. Desataviados. Mortos. “Do pó viemos, ao pó retornaremos.” Despidos chegamos. Despidos partiremos. Enfim, nus, como viemos.


p.s.: Imagem (primeira): "Pietà" - em português "piedadade" - de Michelangelo é talvez a mais conhecida e uma das mais famosas esculturas feitas pelo artista. Representa Jesus morto nos braços da Virgem Maria.

sábado, 11 de abril de 2009

Desvelos, folhas, e algumas palavras, secos.

“Perdoa-me, folha seca,não posso cuidar de ti.Vim para amar neste mundo,e até do amor me perdi.
De que serviu tecer flores pelas areias do chão,se havia gente dormindo sobre o próprio coração?

E não pude levantá-la!Choro pelo que não fiz.E pela minha fraqueza é que sou triste e infeliz.Perdoa-me, folha seca!Meus olhos sem força estão velando e rogando àqueles que não se levantarão…Tu és a folha de outono voante pelo jardim.Deixo-te a minha saudade - a melhor parte de mim.Certa de que tudo é vão.Que tudo é menos que o vento,menos que as folhas do chão…”
(Canção do outono - Cecília Meireles).







Odeio sair por aí quebrando as coisas... Eu sou realmente desastrada... e às vezes acabo quebrando algo de valor....material ou sentimental...de outras pessoas...é totalmente frustrante, tirar algo de alguém... é frustrante quebrar suas próprias coisas porque você não pôde mantê-las “vivas” por algum tempo!... “vivas” ao seu lado. Eu realmente tenho observado o quão tempo duram certas coisas perto de mim... não tenho nada de longa data. É quase uma habilidade ver as coisas desaparecerem na minha frente. Já sequer confiam em mim por isso. Conseqüência. Não os culpo. Tentei levar essa visão para além das “coisas”... bom, não gosto de generalizar, mas percebi uma semelhança. E cheguei à conclusão de que talvez eu seja desastrada em todos os aspectos da minha vida. Pois sempre me pergunto porque eu não fiz de outra maneira. Ou se teria sido diferente se eu fosse mais cautelosa. Comedida. Eu não sei ser outra que não essa. Que se mostra desatinada. Que se reflete estouvada. Quanto tempo levará se... durará se... eu deveria... “se”, “se”... Já ri muito da minha imprudência, e já fiz outros rirem também... mas foi até eu chegar aqui e me dar conta de que cuidar faz-se necessário. Zelar por aquele que se ama. Eu sei amar, mas quiçá não saiba mantê-los. Eu prometi por canção que cuidaria. Não cumpri. Tentei? Não sei. Não durou tempo suficiente. E provavelmente nunca venha saber...



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“Cuidar” - Luana Lins

Zelar:

Fazer permanecer. Não permitir quebrar. Ou cair ao chão, ou tornar-se fugaz.

Manter:

Proferir afavelmente em uma única palavra com a qual tenha inerente todos os efeitos que tornem imperecível aquilo que se ama.

Durar:

Não deixar partir, fazendo-se desnecessária a relutância, pois aquilo que se acalenta, fica, incondicionalmente.

-- Uma interrupção--

Há uma ponta de frieza aqui. Um resquício de ironia. Uma receita. Inútil.
Não me identifico com esse sintagma.

“Zelar”.
“Manter”.
“Durar”.

São palavras férteis que se proferidas por mim, tornar-se-iam secas? Ressequidas em minha boca, em meu descontentamento. Pútrida na minha aquiescência desastrosa. Conformo-me. Emudeço.
Não culpo os outros pela dor. Foram estes pensamentos que trouxeram-me para onde estou neste momento.
Suas escolhas são unicamente responsáveis por seu sofrimento moral.
Secas jazem em minhas mãos, estas folhas, estas palavras, que digo em silêncio, intrépida, mas não as bradarei jamais.
Não tenho uma solução, tampouco cuidado, tudo o que tenho são folhas secas, paradas no chão, e talvez levadas pelo vento, mas ainda assim, seriam só palavras.




quinta-feira, 9 de abril de 2009

"Em que espelho ficou perdida a minha face?"





Eu não tinha este rosto de hoje, assim calmo, assim triste, assim magro,nem estes olhos tão vazios,nem o lábio amargo.Eu não tinha estas mãos sem força,tão paradas e frias e mortas;eu não tinha este coração que nem se mostra. Eu não dei por esta mudança,tão simples, tão certa, tão fácil:Em que espelho ficou perdida a minha face? (Retrato - Cecília Meireles).




Outro dia, estava eu na aula de Redação, absorta em meus pensamentos, e a professora nos pediu para ler certa proposta de redação. Devíamos elaborar um texto de caráter descritivo, a partir da obra literária da Cecília. Digo "obra literária" porque nunca sei a diferença empírica entre poema e poesia. Sei que a linha que separa ambas é muito tênue. Dizem que poesia tem caráter do que emociona, toca a sensibilidade. Tem como função sugerir emoções por meio de uma linguagem. Já o poema sendo a obra em verso em que há intrínseca a poesia. Bom!Independentemente da "alcunha literária" dada a obras como a de Cecília, gosto de observar o efeito que cada uma delas tem sobre mim. Perceber sua intertextualidade. "O que isso me diz?" " O que leio me descreve?"... Não sou ninguém para mensurar o quão bom é um poema/poesia dos gênios da literatura, mas pessoalmente, julgo aquilo que leio, não pela sua métrica, pela ausência ou presença de rimas, pelas palavras rebuscadas etc. Eu aprecio pelo nível de identificação. Pela nitidez do meu reflexo, produzido pelo o que eu li.
Enfim!Depois de tanto procrastinar (!) digo que fiz a proposta de redação na tentativa de responder/descrever "A face perdida no espelho". Na minha perspectiva. Que não se distancia tanto ao do "Retrato", porém, escrevi tentando descobrir não onde estaria minha face perdida, mas sim, o que seria a minha face perdida no espelho.


"O lado funesto da face perdida " - Luana Lins

"Insensato, eu sempre tive este rosto,
taciturno, quase mudo.
Eu sempre escondi meus olhos,
secos e incrédulos,
que manifestavam com desdém,
certa impassibilidade.
Vislumbrava agora, os olhos que
outrora lacônicos, proferiam mais que mil palavras,
as quais recônditas, se revelariam ali.
Enquanto perdida nos meus traços patéticos,
procurava uma definição que simplificasse a minha face.
Os olhos confusos estavam relutantes...
"Será multifacetada?"
A face perdida, - ou as faces? - há de ser encontrada...
então, os olhos, agora prolixos,
desvelar-me-iam que minha face perdida,
é nada, além de minhas próprias palavras, insensatas."






p.s.: Imagem baseada n'O Fantasma da ópera'.
p.s.: Claro que fugi totalmente – tolamente - `a proposta, já que fiz o texto em versos, não em prosa.